novembro 02, 2007

fora de ordem

atividades dispersas num dia celebrado aos mortos. Fogo morto, tempo morto. Há alguma coisa aqui que destoa do ambiente... tum tum... Ah! Um coração. Se o que define a transposição entre o lado de cá e o lado deles, hoje lembrados, é o pulsar sem fim desse músculo, deduzo que existe vida. Meu coração é teu ou meu coração ateu? E me vejo voltando ao discurso da saudade. Sinto saudade de ontem, pra amanhã sentir saudade de hoje. Saudade do que fiz e do que não fiz. Saudade pura. Tem uma pontinha de masoquismo em nós que nos projeta a esse ambiente de memórias. O pensamento perambula buscando resquícios dos dias idos, dos dias em que tudo que eu sabia de você era construído em bytes. Todas as cores do nosso amor podiam ser escolhidas e editadas: ‘ah, mas esse amarelo é muito aberto...; não sei se digo que te amo em times ou em verdana, em negrito ou em itálico...’ E teu rosto era bidimensional. Teu sorriso estático, apesar da sua melodia inconfundível, que os recursos de áudio da Embratel me permitiam ouvir. Lembro ainda da letra harmoniosa, num papel branco, quando nos permitimos pintar o jogo da fala da tinta. E como esquecer a primeira vez que ouvi de tua boca, lançado como uma flecha em minha direção, o termo usual dos amantes? Fiz esse mesmo sorriso amarelo que repito agora, como em todas as vezes que ouço de ti a mesma fala. E me vejo tecendo essa história e recriando espaços, refazendo a casa, depurando os dias. Há alguma coisa no amor que escapa de qualquer compreensão plausível. Eu perco o sono e o chão. Eu ouço o telefone tocar a cada dois minutos. Eu ouço tua voz no corredor e ‘eu não sei onde estás, nem com quem’.

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eu levo o seu coração comigo (eu o levo no
meu coração) eu nunca estou sem ele (a qualquer lugar
que eu vá, meu bem, e o que que quer que seja feito
por mim somente é o que você faria, minha querida)


tenho medo


que a minha sina (pois você é a minha sina, minha doçura) eu não quero
nenhum mundo (pois bonita você é meu mundo, minha verdade)
e é você que é o que quer que seja o que a lua signifique
e você é qualquer coisa que um sol vai sempre cantar

aqui está o mais profundo segredo que ninguém sabe
(aqui é a raiz da raiz e o botão do botão
e o céu do céu de uma árvore chamada vida, que cresce
mais alto do que a alma possa esperar ou a mente possa esconder)
e isso é a maravilha que está mantendo as estrelas distantes


eu levo o seu coração, eu o levo no meu coração


e.e. cummings

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