fevereiro 24, 2009

café sem açúcar

nalgum lugar, onde eu nunca estive, vivem a tua voz e o teu sermão. E mesmo quando mudos, sentenciam meus dias em tua direção. Compreendo teus argumentos, respeito-os, mas confesso, com olhar empoeirado, que me cansa essa espera. A espera de que outros ouvidos rotos compreendam teus desejos e te forneçam as chaves da prisão que construíste ao teu redor.

Nenhum confinamento se faz à revelia da escolha livre. Nem a tuberculose nos tempos de guerra foi mais destrutiva do que o desejo íntimo de permanecer encarcerado pelos hábitos e covardias dos dias. Cada instante é inédito e não precisa de molduras preexistentes; cada instante, no seu tempo, precisa de espaço para se compor ou decompor, de acordo com o que elegemos de importante, de acordo com o que reconhecidamente se quer. E esse querer que se quer é o que impulsiona e impele o livre curso da vontade.

Depois de tuas idas e vindas, pude perceber enfim o que é vontade. Ela se difere de querer. A vontade se faz quando se quer. Fala-se em vontade livre, mas toda vontade é livre, enquanto o querer contenta-se com a clausura. O querer discursa sobre possibilidade, a vontade é que é sempre possível. A vontade não precisa acontecer, à medida que no querer é necessária a escolha. E sempre escolhemos o pragmático, não dá trabalho, já foi posto. A opção pelo excêntrico pode nos sacudir da zona de conforto e mesmo na mais tenra idade, sentimo-nos velhos o bastante para sair da trilha programada. Aí não há querer, há vontade sem impulso maior, há uma vontade maquiada por desculpas fugidias de incapacidade, de falta de recursos, sejam eles reais ou imaginários.

Depois de tuas idas e vindas, sobretudo depois de tuas idas ficaram perguntas que não desejam respostas; ficaram dores que não saram com o repouso; ficaram sonhos que não se desfazem com o despertar; ficaram imagens que não se apagam, nem se ocultam. Depois de tuas idas e vindas, esqueceste de te arrancar de mim.

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